Banquete do tempo

POEMA
POR

Henrique de Oliveira Calheiros

Abro um círculo, abro a boca e devoro um relógio
Devoro porque posso, porque passa
Dentro do círculo mastigo os ponteiros
Eretos monumentos do tempo
Os reduzo a palitos de dente

Conduzo um ritual a Cronos
Uma revolução absoluta
Rompendo com o rompimento
E com a certeza do lamento

A terra vibra e canta solene
Contrasta meu timbre perene
Protesto! Não quero sumir
De um tique para um taque partir

Na Ciranda, comendo
Ascendo assim sendo
Rindo e roendo
Nascido e nascendo

Revolta com cada volta
Que desatina indiferente
Conduz a vida a frente
Independente do que sente
Ou pensa minha mente

Abri um círculo e a boca
E desafio a ideia oca
De aceitar a tradição
Não! Estilhaço esse vitral
Essa sina ancestral

Recuso o que conheço
Mas reconheço que desconheço
Para além de minhas fronteiras
Desconstruo minha cela
Transfiguro em aquarela
O que se passa entre as orelhas

Na vanguarda de minha jornada
Fecho a boca e o portal
Observo a dança astral
Da qual não entendo nada
E em cada elemento
Ecoa um momento
De uma vida passada

Passada a tristeza
O que resta na mesa
É a natureza
Do tempo, da vida
Incompreendida
Decifre-mo-na em paz
Pois no banquete do tempo
Não há história repetida
Pois a cadência de cada batida
É a gente que faz.